não se é artista quando se gosta de futebol e isso é um alívio
Escrevo em pedaços de papel desde que me sei, mesmo que a minha memória seja sempre de desconfiar.
Era criança e escrevia à minha mãe e escrevia ao meu pai.
À minha mãe escrevia nos anos e no dia da mãe. Mas nunca o que me mandavam escrever. Escrevia quando lhe roubavam o envelope do dinheiro e deixavam a carteira intacta, ainda que esta tivesse uma nota a sair como isca para que os ladrões não levassem o envelope do dinheiro a sério numa loja com saldos na rua de Santa Catarina antes de ir comprar os cortinados para os quais tinha poupado não sei quanto tempo, só sei que a poupança se guardava em envelopes brancos e suspeitos. Escrevia para que ela não chorasse porque as mães não devem chorar, toda a gente sabe e, desta vez, toda a gente sabe mesmo porque toda a gente teve, em algum momento, uma mãe.
Escrevia ao meu pai quando o meu pai fazia anos e escrevia no dia do pai, mas nunca escrevi o que me era mandado escrever. Ao meu pai escrevia também em bilhetinhos que deixava em cima do aparador de pau-preto que veio no navio de Angola e que ficava à saída do quarto deles, aos quais ele me respondia prontamente num outro bilhetinho em cima do mesmo aparador que ainda existe, ainda no outro o dia o vi, imóvel como sempre dada a excelente qualidade da madeira, e tudo isto para dizermos um ao outro o quanto nos amávamos às escondidas, porque aparentemente dávamo-nos como o azeite e a água se dão.
Uma vez escrevi assim num papel que decorei porque, ao que parece, gostei muito e achava que fazia mesmo sentido (e, desculpa, vou-me rir antes um bocadinho, pode ser?):
Já está.
Não, agora é que já está.
voo voo.
por muita altura que atinja
jamais poderei sentir o enjoo
e ai de mim que finja
nestas asas não caber.
sinto a brisa quente
mas seria-lhe incapaz de morrer.
porque é tão vago, tão mancha
o momento de a não sentir.
Pffffff! Santa paciência!
Esta inaugura uma data de folhas que espero se tenham perdido no meio de tudo o que guarda o meu pai e se lembra a minha mãe.
Nunca fui muito boa a escrever porque até a mim me aborrece ler o que escrevo.
Pior só os formulários que preencho.
Era criança e escrevia à minha mãe e escrevia ao meu pai.
À minha mãe escrevia nos anos e no dia da mãe. Mas nunca o que me mandavam escrever. Escrevia quando lhe roubavam o envelope do dinheiro e deixavam a carteira intacta, ainda que esta tivesse uma nota a sair como isca para que os ladrões não levassem o envelope do dinheiro a sério numa loja com saldos na rua de Santa Catarina antes de ir comprar os cortinados para os quais tinha poupado não sei quanto tempo, só sei que a poupança se guardava em envelopes brancos e suspeitos. Escrevia para que ela não chorasse porque as mães não devem chorar, toda a gente sabe e, desta vez, toda a gente sabe mesmo porque toda a gente teve, em algum momento, uma mãe.
Escrevia ao meu pai quando o meu pai fazia anos e escrevia no dia do pai, mas nunca escrevi o que me era mandado escrever. Ao meu pai escrevia também em bilhetinhos que deixava em cima do aparador de pau-preto que veio no navio de Angola e que ficava à saída do quarto deles, aos quais ele me respondia prontamente num outro bilhetinho em cima do mesmo aparador que ainda existe, ainda no outro o dia o vi, imóvel como sempre dada a excelente qualidade da madeira, e tudo isto para dizermos um ao outro o quanto nos amávamos às escondidas, porque aparentemente dávamo-nos como o azeite e a água se dão.
Uma vez escrevi assim num papel que decorei porque, ao que parece, gostei muito e achava que fazia mesmo sentido (e, desculpa, vou-me rir antes um bocadinho, pode ser?):
Já está.
Não, agora é que já está.
voo voo.
por muita altura que atinja
jamais poderei sentir o enjoo
e ai de mim que finja
nestas asas não caber.
sinto a brisa quente
mas seria-lhe incapaz de morrer.
porque é tão vago, tão mancha
o momento de a não sentir.
Pffffff! Santa paciência!
Esta inaugura uma data de folhas que espero se tenham perdido no meio de tudo o que guarda o meu pai e se lembra a minha mãe.
Nunca fui muito boa a escrever porque até a mim me aborrece ler o que escrevo.
Pior só os formulários que preencho.
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